terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Conexão

Bom, no meu blog eu admito mais do que no facebook expor minhas opiniões apaixonadas, ou até mesmo meus desabafos. Também não me preocupo com os julgamentos dos críticos facebookianos sobre postagens, primeiro porque considero ridículo indiretinhas via facebook e segundo que se porventura algo me desagradar na postagem de qualquer pessoa que seja, ainda me resta a opção ocultar, mas dificilmente faço isso porque as pessoas que eu permiti que fizessem parte da minha rede, são pessoas que eu tenho total interesse em saber sobre tudo.

Sim essa é uma opinião apaixonada e se você não gosta de pontos de vista desse tipo, recomendo que pare a leitura por aqui.

Amanhã haverá um ato que vai contra a política que o Estado de São Paulo resolveu exercer em relação aos usuários da Cracolândia. E eu irei porque assumidamente sou contra.

Eu cresci na Cracolândia. Por um acaso do destino, de Deus ou de qualquer coisa que se assuma como responsável, nunca fui uma vítima direta das drogas, e graças ao meu pai que sempre trabalhou apesar de possuir "limitações físicas", apesar de ser deficiente, nunca me faltou nada. Porém não sou apática a essa realidade porque a visão ainda continua sendo um dos meus sentidos.

Tenho amigos de infância que se tornaram vítimas do problema social que é a Cracolândia e que acabaram entrando nas drogas. Tive a oportunidade de fazer parte de uma comunidade que lidava diretamente com a recuperação dessas pessoas. Em meio a essa realidade, o que eu aprendi sobre tudo isso, é que o que a Cracolândia possui são pessoas e não zumbis. Pessoas marcadas das piores maneiras possíveis e pelas piores expressões que o nosso sistema prevê para a sua própria existência. Mas que ainda são pessoas.

O Governo de São Paulo agora finge se preocupar com essas pessoas querendo resolver o seu próprio problema torturando-os por meio do cansaço e da abstinência. Um estado responsável pelo seu surgimento, pela sua permanência e agora pela grotesca forma que optou para sua eliminação. Sim, porque eu sempre me lembrarei da forma que optaram para lidar com o problema, nunca apoiei este governo e a partir de agora para sempre não apoiarei.

Eu sou estudante da USP e desde os fatos ocorridos ali com a PM, tenho sido uma ativista constante e por vezes chata a respeito do que a PM significa. Porém, minha opinião sobre a Polícia não surgiu porque me tornei estudante da USP e sobre isso já discursei bastante em um post abaixo. A minha opinião sobre a polícia foi formada desde sempre, isso porque sou a Keyth antes de exercer qualquer papel social. A Keyth cresceu na Cracolândia.Vivi em meio a uma realidade em que a polícia esteve presente apenas para se aproveitar dos usuários tanto quanto traficantes. Por vezes vi da minha própria janela policiais repassando drogas.

Generalizo as pessoas que assumem a profissão de policial? Não. Como em qualquer lugar, corporação, empresa, faculdade, etc, existem os responsáveis e os pilantras. Acontece que ali, naquela região o contato que tive foi com os que são ou se tornaram pilantras.
Já entendi que a própria corporação os cria com seus métodos militares e desumanos, humilhando-os, o filme Tropa de Elite também serve para mostrar isso. Geram seres humanos que transmitem exatamente a forma como são tratados por este próprio estado, pois não possuem salários dignos, e, por mais que tenhamos passado o tempo de ditadura, ainda são preparados para lidar com seres humanos como naquela época.

Em uma conversa com um policial em frente a minha casa, soube por meio dele, que sequer possuem o direito de se organizarem em sindicatos ou de protestar, senão são logo descartados. Perguntei: "Por que você se submete a isso?", e ele me respondeu: "Porque tenho dois filhos para criar". Resta a pergunta: Será mesmo que essa nossa segurança não é questionável? Eu não consigo pensar que não seja e como estudante me levantei para o debate pois enxerguei a força que esse papel social possui. Uma força que um usuário infelizmente não possui para alguns, porque para mim, a opinião que um usuário possui é tão relevante quanto.

A Cracolândia sempre foi esquecida. Esquecida da mídia e da sociedade paulistana. Hoje com a especulação imobiliária ela se tornou uma questão relevante ao governo e a essa mídia golpista e capital que possuímos. Ainda bem hoje temos a internet, mas enfim tomemos cuidado com SOPA e PIPA.

Inevitavelmente a sociedade parece pela primeira vez ter enxergado que essa é uma questão e um problema a ser resolvido por todos, seja por atos, seja pelo terceiro setor, filantropia, etc. ou mesmo para se sentir no direito de opinar a respeito. E devo dizer: é sim. Como cidadãos os paulistanos possuem todo o direito de opinar a respeito do tema, mesmo que isso fira o ego das pessoas que sempre estiveram em contato com essas pessoas. Se isso não fosse legítimo, não poderíamos opinar em relação a nada que ultrapassasse 5km de distância das nossas próprias realidades, e não é isso que ocorre.

A essas pessoas que apesar de não terem vivido essa realidade de perto, mas que possuem a mesma visão, de que os usuários são pessoas e que não há guerra contra as drogas que justifique essa ação mal planejada, que não prevê reabilitação a todos e muito menos a questão da internação compulsória como humana (sim porque isso está sendo proposto), é que eu venho fazer o apelo para que compareçam ao ato de amanhã na Praça da Sé no primeiro horário. Estejamos lá! Eu estarei!

E eu não faço a mínima idéia de quem organizou esse ato, não sei se foi partido, se foi associações que trabalham com essas pessoas, já vi que ambos estarão presentes, assim como cidadãos que se assumem comuns, como eu. E eu também não quero saber! Eu estarei lá, porque sou humana e considero uma verdadeira barbárie a forma como essas pessoas estão sendo tratadas. E se, se sentir ultrajada com qualquer assunto que remeta ao social significa para alguns, necessariamente ser de esquerda, então eu me assumo feliz e com orgulho BICHO GRILO!!! Independentemente disso eu sou de esquerda mesmo, porém considero que ser uma pessoa humana, não está necessariamente ligado ao partido que se apóia ou à ideologia que se tenha.

Pinheirinho me afetou tanto e está me afetando, porque eu vi pessoas que se organizaram, que construíram suas casas sendo desrespeitadas e ultrajadas por um estado que visa apenas o lucro. Percebi que jamais poderei condená-los caso se tornem usuários de drogas, bandidos ou qualquer nomenclatura que se use. Não possuem mais nada a perder, perderam suas casas, perderam seu tempo, perderam sua dignidade. Alguns perderam a presença de pessoas que foram mortas, há o relato dos moradores de uma criança de 3 anos que morreu asfixiada pelas bombas de gás lacrimogênio. A "grande" mídia não noticia isso, mas entre o que me é apresentado pela mídia e o que me é apresentado pelos moradores, eu sem dúvidas fico com a versão dos moradores. Será completamente compreensível se optarem pelo auto suicídio que uma droga como o crack representa.

Sobre o sentimento que essas pessoas carregam consigo mesmas eu nunca poderei ter real noção do que seja, quer dizer não sei, neste sistema nunca podemos contar com o amanhã por mais que nos esforcemos.Deixo abaixo uma música que considero magnífica do Gabriel o Pensador sobre o tema, sobre ser mendigo, sobre ser excluído da sociedade e viver nas ruas, realidade dos usuários da Cracolândia e agora dos ex-moradores de Pinheirinho. Concordo com a letra, de alguma maneira vai de encontro com aquilo que consegui apreender. Sim apreender, porque é impossível aprender sem experiência.

Para quem não quiser ouvir, deixo previamente uma frase da música: "A NECESSIDADE É MAIOR DO QUE A MORAL!". Ah meu amigo, a necessidade é MUITO MAIOR DO QUE A MORAL!!!
Convido: Todos ao ato amanhã!! CONTRA A HIGIENIZAÇÃO E A FAVOR DE TRATAMENTO DIGNO AOS USUÁRIOS!!!!
Porque apesar do desânimo apresentado no texto, ainda acredito sim que as coisas podem mudar. Opto por ser OTIMISTA E LUTAR! Como sabiamente diz uma música do Teatro Mágico: MILAGRES ACONTECEM QUANDO A GENTE VAI A LUTA!

Keyth Costa